Cuiabá, 01 de Maio de 2024

VARIEDADES Sexta-feira, 24 de Maio de 2019, 16:15 - A | A

24 de Maio de 2019, 16h:15 - A | A

VARIEDADES / ATOR

Na fila por transplante, Saulo Meneghetti faz campanha para doença ser reconhecida

Kellen Rodrigues
Marie Claire



O ator Saulo Meneghetti foi diagnosticado com ceratocone - doença que atinge as córneas e compromete a visão - quando tinha 13 anos. Mas somente agora, 20 anos depois, tornou sua doença pública. Nem as pessoas que convivem com ele em seus 18 anos de profissão sabiam do problema.

"No trabalho imprimia meus textos e cenas em letras maiores, chegava bem mais cedo nos locais de gravação para conhecer o espaço. Contava nos cenários quantos passos eu poderia dar para a direita, para a esquerda e onde estavam posicionadas as câmeras, porque depois que as luzes acendessem eu não enxergaria nada", conta ele.

A decisão de tornar público seu dilema pessoal veio após ele receber a notícia de que precisaria de um transplante de córneas. Decidiu que era hora de usar sua voz para dar visibilidade à doença e ajudar outras pessoas que enfrentam o problema. Agora ele é porta-voz de uma campanha para que a ceratocone seja reconhecida como deficiência visual pelo governo e tenha tratamento gratuito pelo Sus. "Muitos portadores do ceratocone não tem condições de seguir com o tratamento, alguns inclusive só recebem o diagnóstico quando a doença já está muito agravada", lamenta.

Saulo tem hoje menos de 30% da visão. "Estou longe de ser um especialista da área, minha intenção é dividir com as pessoas um pouco mais do que tem acontecido comigo. A intenção é debater o assunto, trocar informações com as pessoas, tentar de alguma forma ajudar".

Confira o bate-papo com o ator:

- Quando você descobriu a doença?


Fui diagnosticado com ceratocone 20 anos atrás, na época eu tinha 13 anos. Apesar da doença ser considerada rara, no meu caso foi hereditário, meus pais também possuem. Logo que fui diagnosticado não entendia direito o que estava acontecendo, achava que se tratava de uma dificuldade visual comum, que talvez pudesse ser corrigida com óculos. Fui entendendo com o passar do tempo, mas foi bem difícil.

- Como tem sido conviver com a doença há 20 anos?


Eu falava sobre a doença, e por se tratar de algo que não tinha nenhum tipo de divulgação na época, e também por não encontrar muitas pessoas com esse diagnóstico, foi bem complicado em relação ao entendimento das pessoas. Rolava muitos julgamentos, do tipo “tem problema de visão, então por que não usa óculos?”, “usa lentes de contato por vaidade”, “então seus olhos não são verdes, você usa lentes de cor”. Fui me cansando de ter que sempre explicar a mesma coisa, que para a correção do ceratocone uma das principais formas é a lente de contato. Em alguns casos, como o meu, não resolve com óculos. As lentes são necessidade e não vaidade e que são lentes rígidas, não possuem cor e não alteram a cor dos olhos. Então optei por me preservar de tudo isso, fazia de tudo para evitar que as pessoas soubessem que eu tenho ceratocone, procurei sempre desenvolver minhas atividades normalmente, apesar das dificuldades.

- A doença interferiu de alguma forma em seu trabalho como ator?


No trabalho eu imprimia meus textos e cenas em letras maiores, chegava bem mais cedo nos locais de gravação para conhecer o espaço onde gravaria. C ontava nos cenários quantos passos eu poderia dar para a direita, quantos para a esquerda, onde estavam posicionadas as câmeras, porque depois que as luzes acendessem eu não enxergaria nada. A gente acaba se adaptando a tudo, eu pelo menos sou assim. Agora que meu problema se tornou público é que as pessoas que trabalharam comigo, nesses 18 anos de profissão, estão sabendo que tenho ceratocone.

- E nas tarefas do dia a dia?


As dificuldades estão presentes no dia dia, não enxergar as pessoas na rua, depois ouvir “poxa, passou por mim e nem me cumprimentou”, não conseguir ler rótulos dos produtos, datas de validade, bulas de remédios. Não posso dirigir, não enxergo as placas dos carros, e em lugares com muita claridade também a dificuldade aumenta. Mas nunca permiti que a doença me desanimasse ou desmotivasse em relação a nada. Aos 13 anos fui diagnosticado e aos 15 anos eu já estava trabalhando e continuo até hoje trabalhando normalmente, me sinto apto para isso.

- Como você recebeu a notícia que precisaria de um transplante?


Apesar de ser um passo até que comum para quem tem ceratocone, a gente vai tentando todos os métodos possíveis de tratamentos, o transplante é quase sempre a última opção. Além de acompanhamentos médicos e exames constantes, fiz uma cirurgia em um dos olhos, chamada Crosslink, para tentar estabilizar a doença, mas não obtive sucesso. Então sabia que cedo ou tarde o transplante seria um caminho. Ainda assim, quando recebi a notícia, no primeiro momento foi bem impactante, fiquei abalado, preocupado, triste. Acho que é um processo normal. Depois procurei entender melhor sobre o transplante e trocar experiências conversando com pessoas já transplantadas e outros que aguardam para também fazer o transplante. Tenho recebido muito apoio e carinho, isso tem tornado tudo bem mais fácil e estou confiante em relação aos resultados positivos do transplante de córneas.

- Como funciona a fila, é a mesma do Sus?


A fila é a mesma, Sus e particular, o que ocorre é que todos que estão na fila passaram por avaliação, e é dado prioridades aos casos mais graves ou urgentes.

- E como é a recuperação pós-cirurgia?


Após o transplante de córneas, além das consultas constantes para que o oftalmologista acompanhe os estádios de recuperação, o paciente precisa ficar um mês de repouso absoluto, em alguns casos fazer uso de medicação com corticoide, em outros só o uso de colírios, essas medicações fazem com que diminuam os riscos de rejeição da córnea transplantada.

- Você tem divulgado um abaixo-assinado para que a doença seja reconhecida como deficiência visual. Qual a importância desse reconhecimento?


O ceratocone é uma doença que quase não é divulgada, é considerada rara mas não tem de fato uma estatística do Ministério da Saúde. É importante que seja reconhecido como deficiência visual para que tenhamos informações precisas. O projeto também possibilitará campanhas de inclusão e informação, com isso garantirá inclusive a participação em certames públicos na qualidade de PCD (pessoa com deficiência). Permitirá tratamento e acompanhamento clínico pelo estado, isso vai garantir os direitos desses cidadãos. Muitos portadores do ceratocone não tem condições de seguir com o tratamento, alguns inclusive só recebem o diagnóstico quando a doença já está muito agravada. Estou longe de ser um especialista da área, minha intenção é dividir com as pessoas um pouco mais do que tem acontecido comigo nos últimos dias. A intenção é falar sobre o ceratocone, debater o assunto, trocar informações com as pessoas, tentar de alguma forma ajudar.

 

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