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Terça-feira, 15 de Maio de 2018, 10h:27

Prisões por rombo no Detran resgatam imagem do Judiciário, diz Zuquim

Marisa Batalha

(Foto: Montagem)

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O desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, José Zuquim Nogueira, ao determinar na última quarta-feira (09), a operação Bônus, na 2ª fase da Bereré, deflagrada pelo Gaeco, justificou nos autos, para a que ela ocorresse, que as ‘consequências dos crimes do colarinho branco atingem muito mais que a moral e os bons costumes’. 

 

A operação – por desvios que ultrapassam, segundo o Ministério Público Estadual, a casa dos R$ 30 milhões no Detran -, prendeu o ex-secretário-chefe da Casa Civil, Paulo Taques, seu irmão Pedro Zamar – ambos primos do governador Pedro Taques (PSDB) -, os empresários Roque Anildo Reinheimer, Claudemir Pereira dos Santos, vulgo ‘Grilo’, e José Kobori, além do deputado democrata, Mauro Savi. 

 

Para o magistrado - em justificativas nos  autos -, que crimes como os cometidos pela organização que se instalou no Detran, ‘(...) são macrocrimes, pelo fato de atingirem as estruturas de produção, circulação e consumo das riquezas do Estado, mas acima de tudo afetam a primazia de interesses difusos e coletivos da sociedade, e, muitas vezes, perante crimes comuns contra o patrimônio privado (pequenos furtos), acabam impunes, repercutindo no descrédito do Judiciário e no sentimento de impunidade que assola a sociedade, que repetidas vezes usam o velho chavão de que "no Brasil tudo acaba em pizza’. 

 

O magistrado ainda argumenta sobre a necessidade do Judiciário dar uma resposta a sociedade e resgatar a credibilidade, no que tange aos crimes de colarinho branco e, assim, garantindo a ordem pública.

 

Para o desembargador, o Judiciário necessita resgatar a credibilidade perante à população no que tange à segurança jurídica e, sobretudo, dar uma resposta à sociedade, diante destas práticas criminosas em nome da moralidade e da tutela dos direitos sociais. 

 

‘Colocando fim ao sentimento de impunidade que assola os agentes envolvidos nos crimes de ordem econômica, que, de regra, têm no polo ativo pessoas de alto prestígio e confiança das autoridades governamentais, que se utilizam do uso de informações indevidas, pagamento de propina, favorecimentos ilícitos, subornos e fraudes para o cometimento dos delitos. São pessoas que detêm alto conhecimento legislativo e das lacunas que a Lei não alcança, valendo-se disto para realizar as atividades criminosas’, ainda pontuou. 

 

Ainda lembrando sobre a importância da coleta de provas sem qualquer tipo de interferência, como forma de desvendar todo o esquema instalado no Detran. 

 

Assim, as prisões seriam absolutamente necessárias após as investigações realizadas pelo Ministério Público, que por meio das apurações, oitivas e delações, conseguiram levantar elementos evidenciando a participação dos investigados na prática dos crimes. 

 

‘As prisões se fizeram necessárias, até o desfecho das investigações, almejando o êxito da instrução criminal, sem a interferência destes indivíduos ou qualquer forma de estratégia que comprometa a efetiva coleta das provas necessárias rumo à verdade real’, frisa o desembargador. Ainda ao justificar as detenções, que os investigados estariam prejudicando a elucidação dos fatos, o que poderia impedir ou fragilizar a aplicação da lei penal. 

 

‘Uma vez que já existem provas sobre a existência dos crimes, e indícios suficientes de autoria, inclusive com prova material e mídia digital, que devem ser consideradas relevantes, a demonstrar que, em liberdade, estes indivíduos tanto prejudicam a instrução criminal, quanto podem comprometer a efetiva aplicação da lei penal, furtando-se à verdade, camuflando e mascarando provas documentais fundamentais à elucidação dos fatos”, argumentou. 

 

O esquema 

 

O esquema foi denunciado pelo irmão do ex-governador de Mato Grosso Silval Barbosa (PMDB), Antônio Barbosa, em delação já homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

 

No depoimento de sua delação, ele disse que o presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), o deputado estadual, Eduardo Botelho (DEM), teria se beneficiado com valores autos com um esquema no Detran. 

 

Ainda conforme seu depoimento, as fraudes foram no serviço de registro de contratos de financiamento de veículos, por meio de uma empresa ligada a ele. 

 

Segundo e o Ministério Público Estadual (MPE), o esquema funcionava com a influência de políticos, entre eles Eduardo Botelho e do também deputado estadual Mauro Savi (PSB), que foi preso na operação junto com outras cinco pessoas. As investigações os apontam como supostos líderes desse esquema.

 

A operação também prendeu advogados, primos do governador, empresários e um parlamentar. Todos prestaram depoimento na última quinta-feira (10) e sexta-feira (11). 

 

O nome de Botelho foi citado por outros investigados, entre eles pelo empresário Roque Anildo Reinheimer, sócio proprietário da Santos Capacitação de Pessoal e Treinamento, que é uma das empresas usadas para o desvio de dinheiro do Detran. 

 

Em depoimento prestado em fevereiro deste ano ao Gaeco, ele disse que o presidente da Assembleia Legislativa se tornou sócio da empresa com o interesse exclusivo de receber vantagem indevida. 

 

Segundo o empresário, o parlamentar disse que tinha se integrado ao quadro societário da empresa para receber uma dívida e que, após recebê-la, começou a ser cobrado para o pagamento de outras vantagens. Ele disse ainda que o deputado afirmou que pretendia sair do quadro de sócios da empresa, o que aconteceu dias depois. 

 

Também foram citados os parlamentares Ondanir Bortolini Nininho (PSD), Baiano Filho (PSDB), Romoaldo Júnior (MDB), Wilson Santos (PSDB) e José Domingos (PSD). 

 

Ainda de acordo com o MP, a organização criminosa era formada por 40 pessoas, entre elas políticos, funcionários públicos e empresários que se utilizavam do contrato da empresa EIG Mercados Ltda junto ao  Detran para lavagem de dinheiro e recebimento de propina.  

 

Segundo o MPE, a organização era composta por três núcleos autônomos: Liderança, Operações e Subalterno.  

 

Núcleo de Liderança 

 

De acordo com o MPE, sob a responsabilidade de um núcleo de liderança estaria a formulação e/ou a aprovação, bem como a garantia de implementação, desenvolvimento e manutenção de planos voltados à solicitação e ao recebimento de vantagens ilícitas no âmbito do Detran, autarquia estadual vinculada à Secretaria de Estado de Segurança Pública.  

 

Para o desempenho destas funções, seus componentes se valiam do poder puramente político e, claro, poder político-funcional decorrente diretamente dos mandatos eletivos e dos cargos políticos que ocupam, que lhes garantem a ingerência no órgão. 

 

Núcleo de Operação 

 

Os integrantes deste núcleo são direta ou indiretamente responsáveis pela operacionalização dos esquemas de obtenção de vantagens ilícitas no âmbito do Detran. São eles quem materializam a vontade da liderança do núcleo, tomando as medidas necessárias para que os esquemas de corrupção fossem realizados. 

 

Atuando, com estratégias bem formuladas juridicamente, a fim de esconder a atividade dos líderes a quem estariam vinculados, inclusive, para atos de lavagem de dinheiro. 

 

Comumente, estes agentes intermediários, em razão de sua vinculação a algum dos líderes, obtinham, para realizar com êxito seu trabalho, lucros com as vantagens ilícitas. 

 

Aqui, neste mapa criado pelo MPE estariam entre outras pessoas, o advogado Pedro Jorge Zamar Taques, Roque Anildo Reinheimer, José Kobori, Claudemir Pereira dos Santos. 

 

Núcleo Subalterno

 

Já neste núcleo, ainda de acordo com o Ministério Público, estariam os agentes menores da célula. Na organização criminosa estes agentes exerciam funções de menor complexidade, porém vitais ao funcionamento da organização. 

 

Ainda que fossem atividades meramente executivas de auxílio ao desenvolvimento dos esquemas de obtenção de vantagens ilícitas. Mas responsáveis por fazer fluir o dinheiro relacionado às vantagens ilícitas obtidas pela organização. 

 

Sendo os destinatários primários da propina que tem a incumbência de movimentar o dinheiro, seja para que ele chegue aos destinatários finais, seja para esconder a sua origem ilícita. Além disso, os integrantes deste núcleo são cargos de confiança - aqui neste mapa -, dos parlamentares. Seus papéis eram deixar de exercer sua função parlamentar de fiscalização dos contratos fraudulentos oriundos dos esquemas ilícitos operados dentro da autarquia. 

 

Como começou o esquema 

 

Em junho de 2009, o Departamento Nacional de Trânsito Denatran editou a resolução nº 320/2009, em que ficou estabelecido que os contratos de financiamento de veículos com cláusula de alienação fiduciária, de arrendamento mercantil, de compra e venda com reserva de domínio ou de penhor celebrados, por instrumento público ou privado, deveriam ser registrados no órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal em que for registrado. 

 

E ainda licenciado o veículo, ao qual compete, de forma privativa e intransferível, a supervisão e o controle de todo o processo de registro os contratos, podendo a execução ser contratada com terceiros na forma da lei. 

 

De acordo com as investigações, entre os meses de julho e agosto do ano de 2009, quando Teodoro Moreira Lopes o “Dóia” ocupava o cargo de presidente do Detran em Mato Grosso, teria sido convocado para uma reunião no gabinete do deputado estadual Mauro Luiz Savi, onde já estavam também os investigados Marcelo da Costa e Silva e Roque Anildo Reinheimer.   

 

Na ocasião, Marcelo Silva e Roque Anildo ofereceram a Dóia  a  execução da atividade de registro junto ao Detran dos contratos de financiamento de veículos com cláusula de alienação fiduciária, de arrendamento mercantil, de compra e venda com reserva de domínio ou de penhor dizendo que apresentariam ao então presidente uma empresa para a execução dos serviços sendo essa empresa a EIG Mercados LTDA que antes atuava com a razão social Serviços de Registro Cadastro, Informatização e Certificação de Documentos ltda. 

 

Na ocasião, a empresa se oferecia a formular contrato administrativo com o órgão para prestar o serviço de registro de contratos junto à entidade de trânsito.  

 

Um dos sócios da empresa, a fim de garantir a prestação de serviços, teria se comprometido a repassar o valor equivalente ao pagamento de um mês às campanhas eleitorais de Savi e do então governador Silval Barbosa. Promessa, que após a efetivação do contrato com o Detran teria sido cumprida no valor de R$750 mil para cada um dos candidatos.  

 

Para que a empresa fosse a vencedora do edital, na época, o antigo presidente do Detran determinou que a comissão de licitações do Detran-MT confeccionasse o edital de licitação nos mesmos moldes que a empresa FLD Fidúcia hoje EIG Mercados LTDA já havia vencido no Estado do Piauí. Desde então a empresa é responsável pelo pagamento de propinas a organização criminosa. 

 

Também consta nas investigações, que após a assinatura do contrato administrativo, os investigados Mauro Luiz Savi, Claudemir Pereira dos Santos, vulgo "grilo", Teodoro Lopes e outros investigados se organizaram a fim de garantir a continuidade do contrato, formando uma rede de proteção em troca do recebimento de vantagens pecuniárias da parte da FDL, propina na ordem de 30% do valor recebido pela FDL do Detran, repassado por intermédio de empresas fantasmas que foram criadas em nome dos integrantes da rede de proteção do contrato. 

 

Esquema que teve continuidade com a mudança de governo, agora na gestão do tucano Pedro Taques, com a participação de Paulo César Zamar Taques e seu irmão Pedro Jorge Zamar Taques. 

 

Segundo os promotores, em 2015, quando houve a sucessão no Governo do Estado e Taques assumiu o Palácio Paiaguás - os primos do atual governador Paulo e Pedro Zamar Taques, com ajuda de Valter Kobori -, foram minuciosamente informados sobre como funcionava o esquema e teriam sido convidados a entrarem neles. 

 

Em depoimento, um dos proprietários da empresa EIG Mercados Ltda disse que após acertar os pagamentos com a antiga gestão Silval Barbosa, a empresa EIG Mercados contratou o acusado Valter José Kobori como Chief Executive Officer. Desde então seria ele a pessoa responsável em receber pessoalmente a propina sob título de BÔNUS pelos serviços pessoais prestados a empresa e repassar o dinheiro para Paulo Cesar Zamar Taques. 

 

Segundo o depoimento as negociações foram feitas antes mesmo do resultado das eleições de 2014, quando Valter Kobori já havia combinado com Paulo Taques o auxílio para manutenção do esquema.  (Com informações do TJ e MP-MT)